terça-feira, 27 de agosto de 2013

Sol Nascente é retrato fiel do DF ilegal

09/05/2013 - Correio Braziliense

Leia: Distrito Federal está a um passo de ter a maior favela da América Latina

Visão do Correio

Só a suprema tolerância do poder público com o malfeito pode explicar a formação, em pouco mais de 10 anos, e a apenas 35km do Palácio do Planalto, de favela que já é a segunda maior da América Latina (perde para a Rocinha, no Rio de Janeiro). O Condomínio Sol Nascente, em Ceilândia, tem, oficialmente, 61 mil moradores. Mas estima-se que a população seja superior a 100 mil pessoas.

Impressiona a velocidade com que zona rural ocupada por chácaras produtoras de frutas e verduras foi transformada por grileiros — com a cumplicidade de políticos inescrupulosos — num amontoado de barracos e biroscas. A situação é de calamidade, com quase 90% dos moradores não dispondo de esgoto sanitário, mais de um terço vivendo sem água tratada, 46% dependendo de gambiarras para ter acesso à energia elétrica e a totalidade não contando com postos de saúde nem hospitais.

Para completar, transporte público é raridade, só 10km das ruas têm asfalto, a coleta regular de lixo atende 33% dos moradores (assim mesmo distante de casa) e 87% deles precisam ir atrás da correspondência, que os Correios não entregam em domicílio. A segurança, igualmente inexistente, cabe a três postos comunitários, mesmo número de escolas públicas. Em suma: o poder público fechou os olhos para a ocupação irregular e os manteve fechados para o acúmulo de problemas.

Sol Nascente é retrato em branco e preto da situação fundiária do Distrito Federal. A construção da capital da República, no meio do nada e em tempo recorde, fez de terras de pouco valor razão de cobiça de especuladores, que se aproveitaram da documentação precária então existente para reivindicar posses de origem até hoje duvidosa. Tanto que, 53 anos depois de inaugurada Brasília, milhares de processos ainda tramitam na Justiça.

O tamanho do lucro explica a ânsia especulativa. Apenas dois grileiros presos em abril último teriam vendido 1,2 mil lotes irregulares no condomínio de Ceilândia, lucrando mais de R$ 6 milhões. Lá, a farra teve o auge em 2004, no governo Joaquim Roriz. Agora há processo de regularização em andamento e previsão de obras de urbanização no valor de R$ 220 milhões, mas Sol Nascente precisa de bem mais.

Aliás, o DF inteiro carece de ação consistente do governo no enfrentamento da ocupação irregular do solo e na garantia de serviços públicos aos moradores de boa-fé. E é preciso ser mais rápido do que os aproveitadores mal-intencionados e antecipar-se à desordem. É inconcebível que o centro do poder nacional abrigue cerca de 500 condomínios ilegais, com até 600 mil pessoas. A única explicação para o caos instalado é a histórica impunidade — a falta de vontade política de resolver o problema.