terça-feira, 29 de junho de 2010

Em comemoração aos 50 anos, Brasília ganha nova maquete


Ela foi construída com base em recursos digitais e percorrerá a Europa. Sem patrocínio brasileiro, a obra foi bancada pelo Ministério da Habitação da Espanha


Conceição Freitas - Correio Braziliense
Publicação: 29/06/2010 07:59

Na nova maquete, o Plano Piloto foi reduzido 1.350 vezes, o que não impede o visitante de ter uma visão tridimensional das obras de Oscar Niemeyer e dos traçados de Lucio Costa - (Adauto Cruz/CB/D.A Press
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Na nova maquete, o Plano Piloto foi reduzido 1.350 vezes, o que não impede o visitante de ter uma visão tridimensional das obras de Oscar Niemeyer e dos traçados de Lucio Costa
Antes de esticar suas asas e seus eixos em Madri, Lisboa, Munique e Milão, uma extensa maquete de Brasília, feita com base em fotos de satélite e recortada a laser, está à espera dos brasilienses no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, a partir de hoje à noite. A cidade inventada foi reproduzida em escala 1x1.350, ou seja, o tamanho real do Plano Piloto foi reduzido 1.350 vezes. É um boneco gigante, tridimensional, que vai da Torre Digital (em construção) ao Aeroporto Juscelino Kubitschek, no sentido norte/sul, e da Barragem do Paranoá à Rodoviária, no sentido leste/oeste.

Quem fez a nova maquete da cidade tombada é o mesmo maquetista que construiu aquela que está exposta desde 1988 no Espaço Lucio Costa, na Praça dos Três Poderes. O arquiteto carioca Antonio José Pereira de Oliveira voltou à cidade, mais de 20 anos depois, para se atualizar com os novos contornos do urbanismo e da arquitetura da capital. Foi inevitável a comparação com os tempos do então governador José Aparecido de Oliveira que encomendou a maquete para a comemoração da inscrição de Brasília na condição de patrimônio da humanidade.

As diferenças são tantas na cidade quanto nas maquetes. Em 1988, não havia a Ponte JK, que muito impressiou o maquetista. Também as margens do Lago Paranoá não estavam tão acintosamente ocupadas. “É uma pena ver aqueles apart-hotéis e aqueles condomínios, tudo com telha colonial. Não tem nada a ver com Brasília, foi uma liberação perigosa na beira do lago”, lamenta Oliveira. O olho vigilante para o Paranoá tem razão de ser: a maquete dos anos 1980 contemplava apenas uma pequena área do lago. A nova traz o leito inteiro das águas que recortam as asas de uma ponta a outra.

Três dimensões
Silvestre Gorgulho e o arquiteto José Pereira de Oliveira conversam sobre a elaboração da miniatura da cidade - ()
Silvestre Gorgulho e o arquiteto José Pereira de Oliveira conversam sobre a elaboração da miniatura da cidade

Se a primeira maquete, toda artesanal, feita a partir da sobreposição de plantas e fotos aéreas, tem valor histórico e afetivo, a segunda representa Brasília a partir dos recursos da era digital. “Usamos os recursos do Google Earth. Os prédios mais importantes aparecem em três dimensões. O desenho sai direto do Google e passa para a máquina a laser”, explica o maquetista. As obras modernistas, portanto, serão apreciadas em perímetro, volume e perspectiva, muito mais perto da realidade do que a anterior.

Como será portátil, para a peregrinação pela Europa e por outras geografias ainda indefinidas, a maquete se desdobra em 18 módulos, cada um de 1,60 metro por 1 metro. E se sustenta nas caixas que a contém, para facilitar o trabalhoso processo de montagem, desmontagem e transporte de Brasília mundo afora. Recoberta com uma película plástica, a cidade em miniatura ficará facilmente livre da poeira, ao contrário do que ocorre com a da Praça dos Três Poderes. “A grande dificuldade da maquete atual é que ela precisa de manutenção de seis em seis meses, mas parece que nunca tem verbas para isso”, relata Antônio José Pereira de Oliveira.

A maquete é a estrela principal de uma grande exposição que percorrerá quatro cidades europeias a partir de setembro próximo. Sob curadoria da empresária cultural Danielle Rocha Athayde, a mostra é o resultado de uma dissertação de mestrado no Instituto de Investigação José Ortega Y Gasset, de Madri. Por falta de patrocínio brasileiro e brasiliense, a cidade só verá a maquete. A exposição completa terá fotos aéreas, belíssimas, de João Facó, fotos inéditas de monumentos históricos feitas pelo paulistano Fábio Colombini, especializado em fotos de natureza para catálogos de grandes empresas. “Escolhi Colombini porque queria um olhar de natureza para uma cidade de concreto.”

Também haverá fotos do francês Marcel Gautherot e de Mário Fontenele, o mais importante fotógrafo da construção de Brasília, fotomontagens de Athos Bulcão, mobiliário de Sérgio Rodrigues dos anos 50/60 e obras de Marianne Peretti, vitrinista da Catedral, do Memorial JK e do Panteão da Pátria. A exposição que será vista primeiramente em Madri terá uma livraria com mais de 50 livros e catálogos sobre Brasília, acessíveis à leitura no local.

Patrocínio
Danielle Athayde, curadora da mostra, teve o apoio do governo espanhol - ()
Danielle Athayde, curadora da mostra, teve o apoio do governo espanhol

A exposição só se tornou possível, incluída a fabricação da maquete, por conta do interesse do Ministério da Habitação da Espanha, responsável pela maior parte do patrocínio. A Brasília 50 anos fará parte do calendário espanhol das comemorações do Bicentenário da Independência das Repúblicas Latinoamericanas. Embora tenha sido aprovada pela Lei Rouanet, a curadora da exposição, Danielle Rocha Athayde, informa que não conseguiu apoio de patrocinadores brasileiros. E atribui o desinteresse aos escândalos de corrupção em Brasília. “Pedi tudo, tive que correr atrás de outros apoios.”

Paulista, Danielle mora em Brasília desde os 10 anos de idade. Aprovada num programa de bolsas espanhol no curso de gestão cultural, patrimônio, turismo e natureza, apresentou a exposição como trabalho final do mestrado e, segundo ela, foi aprovada como “o quarto melhor projeto já apresentado ao curso”. Com esse selo de qualidade, procurou o governo espanhol e se animou em montar a exposição tanto na Europa quanto no Brasil. “Mesmo tendo feito um corte muito alto no orçamento público, o governo espanhol manteve o apoio à exposição”, conta Danielle. Do ponto de vista dos negócios de turismo e cultural, esse é um novo investimento: “Brasília está em décimo sétimo lugar na lista de capitais visitadas pelos espanhóis.” A exposição pretende tirar a capital brasileira do fim da fila.

Mostra
A nova maquete de Brasília poderá ser vista pelos brasilienses a partir de hoje, quando for aberta a 22ª Feira da Indústria, do Comércio, da Agropecuária, de Serviços e do Turismo de Brasília (Feicom), a partir das 14h, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães.

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