quinta-feira, 29 de julho de 2010

Iphan quer criar normas mais rígidas para ocupação urbana de regiões em volta da zona tombada

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Em debate do projeto Dois Pontos, promovido pelo Correio, o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional defendeu a criação de regras mais claras para as construções nas áreas próximas ao Plano Piloto

Helena Mader
Publicação: 29/07/2010 07:00 Atualização: 29/07/2010 08:11 - Correio Braziliense
Para garantir a preservação do Plano Piloto, classificado pela Unesco como Patrimônio Mundial da Humanidade, é preciso garantir a proteção de toda a área em volta da zona tombada. Com essa meta, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) quer criar normas mais rígidas para a ocupação urbana das regiões limítrofes à poligonal definida pelo tombamento. Durante debate realizado ontem à noite pelo Correio Braziliense, o presidente do Iphan, Luiz Fernando de Almeida, revelou que o projeto será concluído nas próximas semanas. “A linha do horizonte faz parte do projeto de Brasília, é um valor inegociável”, justificou.

Luiz Fernando foi um dos convidados do projeto Dois Pontos, que mensalmente reúne especialistas em temas diversos com leitores e assinantes do jornal. O evento teve mediação da jornalista Conceição Freitas. Também participaram das discussões o diretor do Centro de Patrimônio Mundial da Unesco, Francesco Bandarin, e a professora da Universidade de Brasília Sylvia Ficher.

Os participantes do debate lotaram o auditório do Correio e atuaram intensamente durante todo o evento. Líderes comunitários, ambientalistas, moradores do Plano Piloto e de várias cidades do Distrito Federal puderam fazer perguntas e discutir sobre a preservação do patrimônio mundial em Brasília. A proposta do Iphan para garantir maior controle das áreas contíguas ao Plano Piloto agradou aos participantes. “O maior desafio para a preservação é garantir uma melhor gestão do território do Plano Piloto e de seu entorno, para que a qualidade de vida verificada na área central possa se estender para todo o DF”, detalhou Luiz Fernando de Almeida.

Modernismo
O italiano Francesco Bandarin, reconhecido como um dos maiores especialistas em arquitetura e planejamento urbano do mundo, falou sobre Brasília e destacou a importância da cidade que foi a primeira representante do movimento moderno a integrar a lista do patrimônio da Unesco. “Brasília é o maior e mais importante exemplo do modernismo. A cidade pode servir como um verdadeiro centro de estudos sobre, por exemplo, a conservação de materiais modernos como o metal”, disse Bandarin. “Brasília é uma fusão de conceitos, um projeto monumental”, acrescentou o especialista.

A professora da UnB e mestra em preservação de patrimônio Sylvia Ficher afirmou que o tombamento da capital federal foi um acerto. Ela destacou dois aspectos que considera os mais importantes no projeto de Lucio Costa para o Plano Piloto. “O primeiro ponto positivo é a preservação da qualidade de soluções urbanísticas. O Eixo Monumental, mesmo sem um paisagismo mais vigoroso, responde com precisão às exigências de uma cidade concebida para ser a capital do país”, explicou. “Outro aspecto positivo são as superquadras, que são uma síntese das experiências de mais de um século no debate das questões habitacionais.”

Sylvia Ficher trouxe para a discussão o assunto mais comentado durante o evento: o trânsito de Brasília. Lembrou que as extensas rodovias que cortam a cidade representam uma corrente urbanística vigente à época da construção da capital, e lamentou o fato de não haver na cidade uma valorização dos transportes públicos. O professor de educação física José Neto, que mora há quatro anos em Brasília, concordou com os argumentos de Sylvia. “Não consigo caminhar pela cidade, o pedestre aqui corre um constante risco de morte. As pessoas na cidade só valorizam os carros”, criticou o participante do Dois Pontos.

Especulação
Outro tema muito debatido durante a edição de ontem do projeto foi a especulação imobiliária em Brasília, o que aumenta a demanda por áreas urbanas e, muitas vezes, estimula as ocupações irregulares, até mesmo em áreas públicas. Apesar desses problemas e de outras irregularidades comuns, como os puxadinhos (1), Sylvia Ficher não acredita que o projeto de Lucio Costa corra risco. “Infrações como puxadinhos são uma coisa, descaracterização do projeto é outra coisa bem diferente. São detalhes quase cosméticos quando se observa a magnitude do projeto de Lucio Costa”, disse.

O presidente do Conselho Comunitário de Segurança de Brasília, Saulo Santiago, questionou a mesa sobre como conciliar a qualidade de vida na cidade com o crescimento. O presidente do Iphan, Luiz Fernando de Almeida, afirmou que não há contradição entre preservação e desenvolvimento. “Mas o tombamento não é o único instrumento de gestão urbana. O que Brasília precisa é de melhorias no processo de gestão das terras”, garantiu o presidente do Iphan.

1 - Regulares, mas contestados
Puxadinho é o nome dado às conhecidas invasões comerciais que se espalham pelo Plano Piloto. Caracteriza-se pela apropriação de uma área originalmente não destinada à construção — na maioria das vezes, os puxadinhos são espaços de circulação pública utilizados pelos comerciantes como extensão de seus estabelecimentos — e, embora regulamentado pela Lei Complementar 766/2008, como a “Lei dos Puxadinhos”, teve sua regularidade contestada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) em abril deste ano.

Depredações e acidentes
As primeiras deliberações do Comitê de Patrimônio Mundial foram divulgadas ontem. Por 14 votos a cinco e uma abstenção, os especialistas da Unesco decidiram retirar as Ilhas Galápagos, no Equador, da lista do Patrimônio Mundial em Risco. O arquipélago, conhecido pelos estudos sobre a evolução de Charles Darwin, ganhou esse status por conta dos riscos do turismo predatório, mas medidas recentes de preservação foram suficientes para que as ilhas saíssem da lista de patrimônio em risco. Os técnicos da Unesco decidiram incluir no rol de sítios que correm perigo as Tumbas dos Reis Buganda, em Uganda. O local foi atingido por um incêndio que, em março deste ano, destruiu quase completamente o prédio principal.

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