terça-feira, 21 de setembro de 2010

Cigarras começam a reaparecer no DF e podem estar trazendo a chuva

Cigarras começam a reaparecer no DF e podem estar trazendo a chuva  

Devagar, as cigarras vão chegando e, muitas vezes sem que as pessoas se deem conta, de um momento para outro parecem ter se apossado de todas as árvores da cidade. Incômodo para uns, deleite para outros, a boa notícia é que, quando esses insetos surgem, a chuva também pode estar se aproximando

Leilane Menezes - Correio Braziliense
Publicação: 21/09/2010 07:50 Atualização: 21/09/2010 07:50
 
O barulho é insistente. Começa devagar e só aumenta. Fica cada vez mais alto e contínuo. O ruído das cigarras tornou-se uma parte de Brasília. Quando elas não aparecem, muita gente acha estranho. Este ano, como a seca durou além da conta, esses insetos demoraram para começar a cantoria. Mas, aos poucos, quem anda pelo Plano Piloto começa a encontrar cigarras e a ouvir o famoso ruído, presságio da tão aguardada chuva. Há mais de 100 dias, não cai uma gota de água do céu de Brasília.

O inseto parece prever a chegada das tempestades: somente quando a umidade do ar fica mais elevada e há água, ele se reproduz. É nesse momento que as cigarras adultas cantam. O canto da cigarra tem o objetivo de atrair o parceiro do sexo oposto para um relacionamento. “O barulho estridente é do macho. A fêmea canta mais baixo. Como a fase adulta dura muito pouco, aproximadamente dois meses, a cigarra copula, bota os ovos e depois tanto o macho quanto a fêmea morrem”, explicou Cristiane Pujol, professora de ciências biológicas da Universidade Católica de Brasília (UCB).

É na época da chuva que os ovos da cigarra eclodem. Os de algumas espécies demoram até 17 anos para desabrochar — caso das cigarras encontradas nos Estados Unidos. Enquanto isso, ficam debaixo da terra. Mas não há cigarras desse tipo em Brasília. As daqui demoram mais ou menos um ano para nascer. Elas passam por três fases de vida: ovo, ninfa (estágio imaturo) e adulta.

O processo é chamado de desenvolvimento pós-embrionário. “A época da chuva é propícia para o aumento de todos os insetos no cerrado. Há uma explosão maior de população em ambientes mais úmidos. Vão começar a aparecer mais besouros, borboletas…”, afirmou Cristiane. Esses bichos são sazonais, ou seja, aparecem em apenas uma época do ano. “Os alunos de biologia saem para coletar insetos e encontram pouquíssimos durante a seca”, comenta a professora.

Superpopulação
A capital parece ser o lugar preferido das cigarras. “Pesquisadores encontraram mais de 10 tipos de cigarra no Distrito Federal. É uma particularidade da cidade, há uma diversidade muito grande”, disse a bióloga. “O Plano Piloto é arborizado, o que facilita a aparição de insetos. Então vem esse barulho que chega a ser insuportável. Em outras cidades não tem tanta cigarra. É uma caracterísca muito particular.”

Quem vive em Brasília e já prestou atenção nos troncos das árvores deve ter percebido a presença de uma carcaça estranha, com aparência frágil. A cigarra troca de esqueleto, é um artrópode (1). Quando muda de casca, o animal deixa-a nos troncos das árvores. “Sempre que a cigarra cresce, troca de esqueleto. Essa casca é chamada de exuvia, a capacidade de certos animais de mudar de pele, sem comprometer a forma”, disse Cristiane.

Sabedoria popular
São muitas as histórias que rondam as cigarras. “Elas cantam tanto que explodem. Se matam à toa”, disse o zelador de um dos blocos da 113 Sul, Moisés Lopes, 30 anos. “Eu gosto delas porque acordam todo mundo logo cedo. Tem alguns moradores que reclamam, mas o que se pode fazer?”, brincou. Há, enfim, quem goste do barulho.

“Esse ano elas demoraram muito para aparecer. Estou triste. Acho interessante elas cantarem para atrair o parceiro. Aquelas que demoram 17 anos para nascer também são impressionantes. Elas cantam, cantam, fazem sexo e morrem. Se eu fosse uma cigarra, não ia querer acasalar”, brincou a aposentada Diva Kischner, 63 anos, moradora da Asa Sul. “As cigarras têm que encontrar um equilíbrio. Teve um ano que elas quase me deixaram loucas”, completou.

Algumas pessoas se surpreendem com o comportamento desses insetos ruidosos. “Eu não sabia que elas cantavam com o intuito de fazer ‘aquilo’. Que bicho interessante e irritante! Semana passada eu encontrei a primeira desse ano. Tá muito seco, deve ser por isso que elas estão sumidas”, opinou a zeladora de um bloco da Asa Sul, Cícera Maria da Silva, 52 anos.

Na Asa Norte, elas demoram para se mostrar. “Ano passado tinha mais, não tenho percebido aquele barulho típico por aqui”, relatou a professora Rosana Amorim, 49 anos, moradora da 113 Norte. “Elas realmente andam sumidas. Como temos muitas árvores, criamos o costume de tê-las por perto. Me acostumei com o ruído. Ver a natureza mudando assim é estranho. Por mais que incomode, faz falta”, afirmou a agente de desenvolvimento Belsânia Rocha, 38, que trabalha na 703 Norte.

Diante da demora das cigarras em aparecer, alguns mostram-se preocupados. “Era para elas estarem cantando adoidado. Será que este ano só vai ter pássaro?”, perguntou Antônia Fernandes, 51 anos, porteira de um prédio da 313 Norte. “Quando eu era pequeno, tinha demais. Eu brincava com as cascas delas. Agora quase não vejo nenhuma por aí”, lamentou o estudante Gabriel Henrique Vieira, 18, morador de Sobradinho. Em locais como o Parque da Cidade e o Parque Olhos d’Água, elas começam a surgir. “Já começou a cantoria, principalmente quando começa o anoitecer”, observou o massoterapeuta Zatopek Jelssimil, 52, que trabalha no Parque da Cidade.

1 - Particularidade
Artrópodes são animais invertebrados, caracterizados por corpo segmentado, membros locomotores articulados em número par e exoesqueleto quitinoso. Crustáceos, insetos, diplópodes, quilópodes e aracnídeos são as principais classes componentes. 
 

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